Bem, não literalmente. Ele não falou só uma única palavra e terminou a revolta por meio disso. Mas sim, ele parou uma revolta graças a uma única palavra.
Quirites.
O ano é o de 47 antes do nascimento de Cristo, e Júlio César está numa posição muito precária.
Há um ano, ele sobreviveu a uma posição ainda mais precária. Sua perseguição a Pompeu através do Adriático em 48 tinha quase terminado em completo desastre, evitando por pouco a catástrofe na Batalha de Dyrrachium antes de esmagar Pompeu em Farsalus com uma reviravolta magistral. Pompeu fugiu com toda pressa para o Egito, e lá ele foi assassinado por um oficial de Ptolomeu XIII. César liderou uma intervenção em uma guerra civil egípcia entre Ptolomeu e sua irmã e esposa Cleópatra, esmagou o exército do primeiro em batalha e determinou a Cleópatra como a única governante do Egito, antes de ir para o norte e destruir Pharnaces, Rei de Pontus.
As coisas estavam boas para César em 47 AC.
No entanto, a morte de Pompeu não tinha parado os seus apoiantes. Os Optimates reuniram uma vasta força de catorze legiões combatentes na África, com as quais estavam determinados a esmagar César. César estava em desvantagem numérica, como sempre, mas confiava em si próprio e nos seus homens, veteranos de mais de uma década de campanha, experientes e endurecidos pelas batalhas. Os quatro dos seus melhores, o Sétimo, o Nono, o Décimo e o Décimo Segundo, estavam acampados e prontos na Itália, fora de Roma, sob o comando de Marco Antônio.
Mas a situação deteriorou-se. As quatro legiões estiveram esperando as suas liberações, bem como o pagamento que lhes seria dado e o bônus ainda não pago que lhes foi prometido diante de Pharsalus. Como Júlio César ficou no leste, a agitação cresceu rapidamente, e os melhores de César fizeram motins, exigindo seus pagamentos e liberações.
Antônio rapidamente perdeu todo o controle. Tropas descontentes começaram a pilhar propriedades locais. A diplomacia revelou-se inútil, até que o próprio César chegou.
Ele sabia que a situação era crítica. Para ter a menor esperança de vitória contra os Optimates, César precisava do seu quarteto de ouro. No entanto, ele tinha tão pouco dinheiro que ele não podia nem pagar o que devia aos soldados, quanto mais convencer os legionários a servirem novamente para a sua próxima campanha africana. O destino da Guerra Civil estava nas mãos inconscientes das quatro legiões.
Assim, as quatro legiões se reuniram ao sul de Roma, e César se levantou em cima de um palco na frente delas. As legiões rebeldes caíram em silêncio, envergonhadas demais para se amotinarem na presença de César. Naquela voz gelada e cortante de César, ele perguntou: O que é que eles queriam que era tão precioso para se revoltarem no coração da República?
Os soldados se viram envergonhados demais para exigir dinheiro do comandante que tanto adoravam, que tanto confiava neles. Então eles tocaram em seu outro problema: eles eram veteranos que lutaram por muito tempo por muito pouco. Queriam as suas liberações. Eles queriam ir embora.
César olhou para as suas fileiras e proferiu uma palavra que nunca lhes havia dito antes.
"Quirites".
"Cidadãos".
Cidadãos. Não soldados. Cidadãos. Com uma única palavra, César efetivamente marcou quatro legiões inteiras: efetivamente declarou que sua deslealdade já os havia libertado de seu serviço.
Então ele continuou. Ele continuou dizendo que eles seriam efetivamente dispensados, imediatamente. Mais ainda, César reconheceu que lhes devia dinheiro... e declarou que o pagaria com saque dos Optimates, logo após ganhar sua campanha com outras legiões.
Se havia um soldado que ainda tinha sua determinação intacta depois de "Quirites", foi aí que ela se quebrou. Essas não eram legiões comuns diante de César naquele dia fatídico. Eram os Legio VIII, que marcharam com César por todas as Guerras Gálicas. Eram o Legio IX Hispanica, o Legio XII Fulminata, a legião do raio. Eram Legio X Equestris, a legião favorita de César, a mais devotada de seus veteranos, a primeira legião levantada por sua própria mão. Eram veteranos que marcharam uma década e meia com César.
O pensamento de que ele poderia não ter precisado deles não era meramente inconcebível, mas totalmente agonizante. O que, ó leitor, eles responderiam quando inevitavelmente perguntados: Legio Equestris, onde você estava quando César conquistou a sua maior vitória na África?
A vontade dos soldados se desfez.
Eles cercaram o palco do orador vigoroso, implorando por perdão e para serem levados para a campanha norte-africana. Primeiro César fingiu indiferença, depois fingiu ser conquistado. Com entusiasmo, as quatro legiões juntaram-se a ele pela África, onde ele esmagou decisivamente os Optimates na Batalha de Tapso.
César tinha recuperado quatro legiões de veteranos indisciplinados com pouco mais do que o amor que os seus homens tinham por ele, combinado com uma única palavra.
"Quirites".
"Cidadãos".
Fonte: Cem Arslan
Na Guerra de Independência, o Brasil venceu a Batalha do Pirajá, que já estava praticamente perdida, quando o corneteiro Luís Lopes tocou degola da cavalaria ao invés de retirada, provocando pânico nas tropas portuguesas, já demasiado estendidas, que estavam em perseguição aos brasileiros. A sorte virou, e os brasileiros conseguiram expulsar os portugueses do campo de batalha. Note-se que, até o final da batalha, não havia qualquer efetivo de cavalaria pronto a entrar em ação.
Nessa mesma guerra, os brasileiros venceram a Batalha de Cachoeira atacando a canhoneira portuguesa que castigava essa cidade com uma flotilha improvisada de barcos de pesca e canoas, cercando o inimigo e forçando-o a render-se.
Uma outra batalha naval de resultado semelhante foi aquela travada diante de Itacoatiara, no Amazonas, em 1932. Uma flotilha constitucionalista, tendo zarpado de Óbidos, tinha um poder de fogo considerável e estava prestes a tomar Manaus, quando uma flotilha legalista desceu o rio e abalroou os vasos constitucionalistas, tirando-os de combate imediatamente e salvando a capital.
Também nessa Revolução, a cidade de Cunha, ocupada nos primeiros dias da guerra por uma fração de 8 fuzileiros navais, foi libertada por 12 voluntários civis de Guaratinguetá, levemente armados e sem treinamento nenhum. Usando uma matraca, fizeram o inimigo acreditar que portavam uma metralhadora pesada, pelo que este debandou, a pé, de volta a Paraty. Isso deu aos constitucionalistas o tempo de guarnecer e fortificar Cunha, que resistiu até o fim aos assaltos de aviação e artilharia dos legalistas.
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