Politico e general…
Estamos a falar de um membro do 2.º Triunvirato, que acabou perdendo para Otaviano na luta final pelo poder, mas que teve uma carreira rica e merecedora.
Marco António era parente de César. Na sua sua juventude foi membro do círculo do demagogo Clódio, que aterrorizava seus adversários políticos com a ajuda de bandos armados durante as lutas pela supremacia no submundo de Roma. Mais tarde, Marco António serviu sob o comando de César na Gália, onde ganhou experiência militar. Com o tempo, tornou-se um homem importante de César e, em sua ausência, um representante de facto, por exemplo, durante a presença de César no Egito. Naquela época, porém, ele não conseguiu evitar que alguns nobres escapassem do controle. Depois de César marchar contra seus oponentes nos Bálcãs, António o seguiu com reforços da Itália (ver Batalha de Farsalus Resposta de Eduardo Santos para Como acabou o conflito entre César e Pompeu? ).
Após o assassinato de César, António, na época já um cônsul, usou vários métodos, incluindo falsificar documentos escritos do falecido, para lidar com a situação. Os outros césaristas formaram uma frente única apenas para perseguir os seus interesses individuais, e, mesmo em suas fileiras, os indivíduos assumiram posições diferentes sobre as medidas do ditador.
(Marlon Brando, interpretando Marco António)
A primeira reação do Senado foi hesitante, confirmando a validade de todas as medidas de César, mas ao mesmo tempo garantindo a impunidade de seus assassinos. António, que foi cônsul em 44 aC e agiu como o herdeiro de facto do poder de César, inicialmente assumiu uma posição conciliatória no Senado. Lépido, que serviu como magister equitum durante a ditadura de César, assumiu uma postura mais radical, mas não conseguiu se afirmar nem contra o Senado nem contra António. Mas António decidiu atuar de forma mais consistente por ocasião do funeral de César, quando em um discurso fúnebre dramático ele atiçou a multidão contra os assassinos de César, que foram forçados a fugir de Roma (recuaram para o leste). A popularidade de António cresceu. Apesar de sua propensão para a vulgaridade, ele foi um líder militar e político extremamente capaz, pelo menos até a época do "cativeiro egípcio". Tumultos estouraram na cidade, envolvendo setores radicais da população exigindo a vingança pelo assassinato de César. No entanto, esses distúrbios foram logo reprimidos pelo próprio António.
(Marco António no funeral de Cesar. Fez um discurso emotivo e galvanizou o povo contra os assassinos de Cesar e seus apoiantes).
A situação ficou mais complicada quando Otaviano apareceu em cena, e a quem César havia adotado. António ignorou suas exigências, fez concessões ao Senado e, ao mesmo tempo, tentou obter o favor dos ex-legionários de César. No entanto, a oposição a António foi mais forte no Senado, cujo principal representante foi o excelente presidente da Câmara, e orador, Cícero. Seu ódio se manifestou em catorze discursos que proferiu nas viradas de 44 e 43. Neles, ele atacou Marco António como um homem sem personalidade, apoiado na força militar e ameaçando a república. Ele se referiu aos discursos de Cícero como "as Filipinas", continuando assim a tradição dos pronunciados discursos de Demostenes contra Filipe II (Nota do tradutor: Rei da Macedónia e pai de Alexandre Magno). Com o apoio de Cícero, o jovem Otaviano aos poucos começou a ganhar o favor do Senado, que, afinal, não tinha escolha, pois para se afirmar contra António, tinha de entrar para o Senado.
(Otaviano)
Em abril de 43 aC, a coligação do senado com Otaviano conseguiu derrotar António perto de Mutina (d. Modena) e o forçou a se retirar para a província de Narbonne. António foi declarado inimigo do estado, Decimus Junius Brutus tornou-se o comandante supremo do exército na Itália e todo o leste do império ficou sob o poder dos assassinos de César. O filho de Pompeu, Sexto, também apareceu ao lado do Senado, que, graças a uma forte frota, controlava a metade ocidental do Mar Mediterrâneo e controlava as ligações marítimas entre a Itália e o Mediterrâneo. António já havia tentado estabelecer relações com ele, mas não antecipou novos desenvolvimentos. No entanto, António foi acompanhado por vários senhores da guerra, incluindo Lepidus. Então, o Senado cometeu o erro de perder o interesse em uma maior cooperação com Otaviano, na qual ele via apenas um político jovem e inexperiente. O Senado rejeitou sua proposta de se tornar cônsul quando os dois cônsules completos de Mutina morreram (pensava-se que Otaviano tinha desempenhado um papel em suas mortes). Em novembro, o ofendido Otaviano reconciliou-se com António e Lépido em uma reunião em Bonónia (Bolonha). Todos os três garantiram a soberania por cinco anos com a tarefa de restabelecer o antigo sistema de governo. Assim surgiu o "segundo triunvirato", criado em contraste com o primeiro com o consentimento formal do Senado.
(Batalha de Mutina)
Após um expurgo entre inimigos políticos, no qual trezentos senadores e dois mil cavaleiros foram prescritos e levados à morte (Cícero estava entre as vítimas *), António e Otaviano cruzaram o mar Adriático e derrotaram Bruto e Cássio em duas batalhas em Filipe, na Macedónia.
((*) Nota do tradutor: O ódio de Marco António contra Cícero era de tal ordem, que ordenou aos seus assassinos, quando o apanhassem, que lhe cortassem a cabeça e as mãos. Depois, mandou pregar as mãos de Cícero na porta de entrada do Senado. )
Nenhuma decisão foi tomada na primeira batalha, pois António derrotou Cássio, que então se suicidou, enquanto Otaviano foi derrotado por Bruto. Isso só fortaleceu o prestígio de António. Apenas a segunda batalha marcou o fim das tropas republicanas. Brutus também tirou a própria vida, o resto da frota escapou para Sexto Pompeu, que, no entanto, não interveio na guerra. Graças ao prestígio conquistado, António teve uma palavra decisiva na divisão do império - ele mesmo recebeu o Oriente e a Gália, Otaviano foi para a Itália, ficou com a Espanha e Lépido ficou com as provincias de África. Otaviano enfrentou a tarefa de garantir a posse de terras aos veteranos, o que era uma questão candente, pois a terra prometida precisava ser confiscada dos proprietários originais, abrindo caminho para a agitação na Itália. António parece tê-lo manobrado deliberadamente para essa situação. Os motins ocorreram, mas Otaviano, com a ajuda de seu líder militar Marco Vipsanius Agrippa, conseguiu eliminá-los. Seus problemas foram causados pelos seguidores de Marco António, liderados pelo irmão, Lúcio António. Ele então tentou penetrar pelo norte da Itália na Gália e unir forças com as tropas de António, mas foi cercado em Perusia. Na virada dos anos 41 e 40, houve outra medição de forças entre Otaviano e os seguidores de António na região de Perusia, que culminou com a vitória de Otaviano. Isso se tornou um sinal para a saída em massa dos aliados de António da Itália, que se tornou domínio de Otaviano. Os acontecimentos na Itália e a influência de Sexto Pompéia forçaram Otaviano a encontrar uma solução mais diplomática para a situação. Em 40, um acordo foi alcançado em Brundisium sobre a divisão das esferas de poder. Otaviano expandiu sua influência no oeste e na Ilíria, António permaneceu no leste e Lépido manteve a África. O casamento de Marco António com a irmã de Otaviano, Otávia, pretendia fortalecer o relacionamento. Eles concluíram um acordo de triunvírus com Sexto Pompeio, segundo o qual ele deveria manter a Sicília, Sardenha e Córsega e obter o Peloponeso Acaia. Logo houve um conflito entre Pompeu e Otaviano, no qual Sexto Pompeu foi inicialmente mais bem-sucedido. Marco António não interveio deliberadamente contra Pompeu para aumentar os problemas de Otaviano. No entanto, em 37 outro acordo foi alcançado em Taranto, que estendeu o triunvirato por mais cinco anos, António forneceria navios contra Pompeu, enquanto Otaviano enviaria algumas de suas tropas para ajudar António na guerra iminente contra a Pártia. Otaviano então conseguiu derrotar Pompeu na batalha de Nauloch com a ajuda de seu grande almirante Agrippa. Pompeu escapou para o leste, mas foi assassinado pelas tropas de António. Lépido ajudou na luta contra Pompeu na esperança de que ele conseguisse capturar a Sicília. No entanto, Otaviano ganhou tropas desse triumviro para o seu lado e privou Lépido do poder militar e político. Tudo o que restou a Lépido foi o título de pontífice supremo, que ele manteve até sua morte em 12 aC.
(António e Cleopatra)
O fim deliberado do triunvirato prenunciou a luta iminente entre os dois governantes. António, enquanto isso, estava construindo sua posição de poder no leste. Na Grécia e na Ásia Menor, ele recebeu grandes honras da população local. As fabulosamente ricas e populosas províncias orientais não foram escolhidas por acaso, eram a plataforma ideal para a luta pelo controle de todo o império.
No Oriente António também conheceu a Rainha Cleópatra do Egipto, outra grande personagem deste drama, desde a época em que ele serviu ao senhor da guerra Gabinius e formou uma escolta da rainha e de seu pai no caminho de volta para o Egito. Sendo agora o homem do poder naquela zona do mundo, António convocou Cleopatra para um encontro em Tarso.
Em 41 aC ela chegou em uma galera luxuosa, com um verdadeiro espetáculo de sensualidade, montado para “desarmar” e seduzir o Grande Homem, acompanhada por uma frota de navios menores. Marco António sempre gravitou em torno do Oriente, seu esplendor, subtileza e luxo bárbaro, tão contrário ao estilo romano, o seduziam. Assim, ela conseguiu impressionar pessoalmente rude brutamontes. Após a morte de César, o sonho de Cleópatra de um império romano-oriental foi adiado, mas agora ela encontrou outro homem que poderia cumprir suas ambições. Do lado de António, a enorme riqueza do império do Nilo certamente não era desprezível. Mas o lado pessoal era muito mais forte - António passou a virada dos anos 41 e 40 no Egito, sem abordar a questão das províncias orientais. Como diz Plutarco, "ele ficou tão fascinado por Cleopatra, que a seguiu pessoalmente até Alexandria. Lá, como um jovem desperdiçando o tempo livre, ele passava seus dias se divertindo em jogos, desperdiçando os bens mais valiosos em prazeres, como diz o orador Antífona, ou seja, o tempo." Os partas aproveitaram-se disso e alcançaram um sucesso inesperado em um ataque aos territórios romanos. António se recuperou, e seu esforço foi para se aproximar de Otaviano, o que levou aos acordos em Brundisio e Taranto. Em seu relacionamento, no entanto, os dois não excederam o nível de táticas mútuas. Nos anos 39 e 38, António conseguiu restaurar o domínio sobre as áreas ocupadas pelos partas. Em seguida, ele tentou atacar os partas em seu próprio território, mas suas tentativas não lhe renderam ganhos territoriais.
Seu interesse já estava focado em Cleópatra e no fortalecimento de seu poder. Em 36, casou-se com ela, e isto sem se preocupar em se divorciar de Octavia. Esta atitude foi aparentemente motivado pelo esforço de obter apoio financeiro para uma nova campanha contra os partas. António ofecereceu generosamente a Cleópatra grandes áreas do império - Síria, Cirenaica, Chipre, parte de Creta e Ásia Menor. Cesarion - o filho de 13 anos de César e Cleópatra foi confirmado como governante do Egito. Quando aos filhos de Antônio e Cleópatra - Alexandre Helios, de seis anos, tornou-se rei da Arménia e de alguma forma no futuro também da Pártia, sua gêmea Selena foi nomeada rainha da Cirenaica e a Ptolomeu Filadelfos, de dois anos, foi dado à Síria e à Ásia Menor. Em relatórios do Senado, ele justificou isso dizendo que "a grandeza do Império Romano não se reflete no que Roma recebe, mas no que distribui". Esses factos provocaram um sentimento de ultraje e repulsa na Itália e em Roma. Além disso, António era celebrado em estátuas como um faraó, e isso era demais para os romanos. Otaviano não teve muito trabalho. Depois de uma ação propaganda bem feita, António tornou-se um traidor, um traidor dos interesses romanos e escravo de uma prostituta egípcia (há uma forte reminiscência do épico Eneida em relação à Rainha Púnica Dido). Além disso, Otaviano publicou o conteúdo do testamento de António (provavelmente forjado) no Templo das Virgens Vestais, onde António reconheceu Cesarion como o filho legítimo de César, fez referências aos filhos que teve com Cleópatra e expressou o desejo de ser enterrado ao lado de Cleópatra em Alexandria. Isso convenceu até grupos hesitantes a aderir à onda de resistência contra António.
(Marco Vipsânio Agrippa, principal general de Julio Cesar Otaviano)
Originalmente, António queria atacar Roma através do Mar Adriático, contando com suprimentos de portos importantes. No entanto, todos os pontos estratégicos foram ocupados por Otaviano. A batalha decisiva finalmente ocorreu em Actia em 2 de setembro de 31 aC. António aparentemente estava ciente da situação estratégica desfavorável, então ele queimou grande parte de seus navios de abastecimento para que não caíssem nas mãos do inimigo. Ele mantinha apenas grandes galés de guerra e a frota de Cleópatra. A baía se tornou uma armadilha quando os navios de António partiram por uma saída estreita para o mar, com a frota de Otaviano fechando o caminho para eles. António tentou romper o bloqueio, o arco dos navios de Otaviano começou a recuar, atraindo-o para o alto mar. Os pequenos navios de Otaviano (rápidos Liburnos de duas fileiras, feitos em estaleiros da Dalmácia) cercavam as desajeitadas galeras de António, que por sua vez estavam cobertas por flechas vindas de cima. A batalha estava longe de terminar quando a frota de Cleópatra fugiu. Surpreso, António não acreditou em seus olhos, finalmente foi transferido para um pequeno barco, alcançou Cleópatra e foi transferido para o navio dela. "Os inimigos observavam com espanto enquanto navegavam com velas cheias e se dirigiam ao Peloponeso. Assim que viu o navio dela partir, António esqueceu tudo, fugiu e traiu aqueles que lutaram e morreram por ele... ". Quando os soldados de António descobriram, a batalha acabou. Aparentemente como uma realista, Cleópatra decidiu que a batalha estava perdida e decidiu salvar o que pudesse. Ou ela queria manter a frota como base para novos combates ou – segundo algumas opiniões - ela “atirou” Antonio ao mar e queria seduzir o terceiro romano - Otaviano. A frota dela navegou para Alexandria e Otaviano os perseguiu. António ainda tentou resistir em Alexandria, mas foi abandonado por seu exército. Otaviano tomou Alexandria em 1º de setembro de 30 aC. António se suicidou com uma espada em desespero. Cleópatra embalsamou-o ela mesma e enterrou-o como um faraó. Otaviano, inume ao brilho oriental, deixou claro que conduziria a rainha acorrentada em sua procissão do triumfo. Cleópatra também cometeu suicídio, segundo algumas fontes ela foi picada por uma cobra venenosa, segundo outras ela escolheu uma agulha cheia de veneno de cobra.
O resultado da Batalha de Actius significou que o Ocidente teria um papel dominante no império no futuro. O Actium confirmou a posição secundária da metade grega do império. A liderança política do império estava nas mãos da Itália e de Roma. A diferença entre o Ocidente e o Oriente foi mais tarde controversa, o que se refletiu principalmente no desenvolvimento que se seguiu à divisão do império após a morte de Teodósio. Se António e Cleopatra tivessem vencido, provavelmente teriam estabelecido um regime voltado para a cooperação entre as duas culturas. Mas o vitorioso Augusto era de opinião que os romanos deveriam manter a dominação política sobre os gregos, dominação abertamente promovida pelo poeta de sua corte Virgílio, autor do épico nacional Eneías. A conscienciosidade e a diligência soberana de Otaviano e Lívia eram, apesar da promoção da hegemonia italiana, provavelmente uma alternativa melhor nas condições de transição da república para o império. A questão é se António e Cleópatra, embora mais tolerantes multiculturalmente, mostrariam a mesma previsão em relação ao ainda forte sentimento republicano de romanos e italianos. O governo de estilo monárquico, e podemos dizer abertamente monárquico, sobretudo do tipo oriental, provavelmente levaria a mais agitação. Isso era aceitável apenas em algum momento da época de Diocleciano e Constantino. O próprio Otaviano teve que disfarçar cuidadosamente sua autocracia sob a fachada republicana.
A memória de Antonio no Oriente permaneceu viva. Quando um membro da família imperial, Germânico, neto de Antonio, apareceu ali em serviço, ganhou uma popularidade extraordinária. Se pretendia ganhar um trono para si mesmo, como sugerem algumas teorias (entre outras coisas, ele teria entrado em Alexandria descalço, sem guarda e no discurso grego, o que poderia ser um tributo à superioridade cultural da cultura grega ou um gesto político calculista ), é possível que a sua morte tivesse o dedinho da avozinha Lívia, a eminência parda da família imperial (mas esta historia fica para outra altura).
O foco do poder permaneceu no Ocidente, e assim foi até o governo de Constantino, quando o Oriente começou a desempenhar um papel mais importante novamente.
Site: Antický Svet
Tradutor: Eduardo Santos
Bonus: da série "Rome", da HBO
James Purefoy interpretando Marco António
Tradução: Estou contente que estejas tão confiante. Alguns chamariam a isso Hubris.
(dizendo para Cesár)
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