“Não è a prata que se envia à Espanha,
É o sangue e suor dos Índios.”
Frei Domingo De Santo Tomás, Dominicano, Sec.XVI.
A Bolívia já não era colônia Espanhola desde 1825, no
entanto, a exploração da PRATA
continuava , por empresas europeias e Mão-de-obra indígena.
A mineração era acentuada na região andina, sobretudo, em
Potosi ( em língua local: desabrochar), sendo os índios Aymara
,locais,auxiliados pelos Quechua,do Peru.Estas etnias mineravam
,incansavelmente para fazer valer o ditado Espanhol : “Valer Um Potosi”,isto é:
“Valer uma fortuna”.
NO inicio da
colonização,os índios ,escravizados pelos Castelhanos, arrancavam das entranhas
das montanhas o rico mineral, em troca da vida.Fome,frio,pneumonia,acidentes e
torturas deram fim a gerações de
indígenas, que contavam ,eventualmente, com o beneplácito de alguns servos da
igreja.
Agora,em pleno Sec. XiX, 1860, os mineiros eram remunerados,muito
mal , é verdade, e gastavam seus parcos recursos nos empórios dos europeus que
se estabeleceram no em torno do povoado minerador.Os Comerciantes,em
maioria,espanhóis,nutriam verdadeiro
asco pelos trabalhadores; a quem consideravam sujos,ignorantes e pagãos.
No entanto, um novo filão de Prata foi encontrado, comoção
geral! A noticia se espalhou como a peste...
Em polvorosa, os comerciantes, começaram a se mudar para o
povoado,para melhor oferecer os seus produtos aos ex-fedorentos,eram, afinal criaturas
de Deus e possuíam almas,alem, é claro,
das riquezas que adviriam das extrações.Para estimular a produção ,as
mineradoras europeias ofereceram um percentual –mínimo aos que conseguissem
mais prata.
No intuito de obter
mais lucros, os mercadores passaram a oferecer novos produtos : Tecidos
finos,bijuterias de além-mar,itens de armazém,especiarias...Tudo , anotado na conta, pois os indígenas não
dispunham de dinheiro, porem,´”La Plata” descoberta e a possibilidade de altos
lucros ,contornaram esta situação.
O anterior olhar
altivo dos mascates deu lugar a uma convivência quase humana com os nativos.
Quase humildes ,ofereciam suas quitandas ...
Uma senhora em particular,recebeu muito bem um casal de
comerciantes -dada a concorrência,muitos passaram a visitar seus clientes- Ela
era europeia e havia se casado com um nativo, para espanto geral.Mas isto,não
importava agora,afinal negócios são negócios.
Enquanto os homens conversavam na sala e bebiam um
licor-trazido pelo comerciante,nada daquela cerveja fedida que parecia urina de
cavalo- as damas ,retiradas ,trocavam confidencias. Elas já se comunicavam , a
senhora comerciante trocava seus Paes e broas por saborosos POEMAS. A poetisa se auto- intitulava “A holandesa” e
esta relação já durava algum tempo.
Trigo por Literatura, o marido da poetisa era semianalfabeto,já o marido da comerciante não percebia ou não
ligava. Caprichos de mulher e havia sempre demanda.
Subitamente os trabalhadores adquiriram um encanto
fascinante para os refinados mercadores,que paparicavam seus estimados”Clientes”
(agora eram chamados assim);não poupavam elogios aos incansáveis esforços nas
minas ,ao valor deste nobre trabalho,o que era visto antes como “braçal e
primitivo”. Novas ofertas ,vindas de Londres ,Madrid,Paris e Amsterdã.Tudo
anotado,sem preocupações.Todos deram garantias.
O Ceticismo e desconfiança iniciais dos nativos-séculos de
exploração e aviltamento- foi cedendo lugar a uma autoimagem diferente. Deviam
ser cavalheiros também...
A sedução é arma poderosa e aos poucos ,até os mais rudes e
desconfiados mineradores foram cedendo as “maravilhas”-por um bom preço;do
mercado.
Dom Curro, proeminente comerciante , teve uma ideia
brilhante.
-“São trabalhadores honestos ,bons consumidores,merecem
alguma diversão.
Por que não trazermos o bordel ambulante da madame
Dupret,que esta em cochabamba,afinal há
muitos homens solteiros e muitos casados e infelizes ( a
maioria);mediante uma pequena comissão ,podemos restaurar o bar ( antiga
estrebaria)e implementar os negócios.Com certeza ela tem muitas “meninas” para
diversão de todos...´´
Dito e feito. A trupe de diversões dionisíacas ,chegou ao
local,em meio a euforia generalizada.Apesar do protesto solitário do único
pároco local e dos resmungos das
vetustas senhoras de bem. O escândalo foi maior , quando se soube que
Dom Blasco,serio comerciante e pai de família ,deixou o lar e passou a residir
na “Cantina”,como a chamavam,mortalmente atraído pelos olhos azuis e sotaque
Frances de Gigi.
As noites , nunca mais foram as mesmas,mulheres ,bebida e
musica regavam as madrugadas como se sabe os predadores caçam melhor à noite de
modo, que quando escurecia o vilarejo acendia como um lampião na mata e o “bar”
recebia os sedentos e calorosos visitantes,mas,no dia seguinte, o trabalho nas
minas era retomado religiosamente.Tudo dependia disto.Esta rotina durou alguns
meses,a promessa era de mais prata.
Um funcionário
ambicioso, comunicou a matriz de
uma mineradora em Madrid, que ,de
imediato enviou um Expert para avaliar a descoberta. O perito chegou,daí a alguns dias, cercado por curiosidade e
exaltação. Mr.Thomas Marshall, da Grã-Bretanha,que
começava a dar os primeiros passos na direção da Revolução Industrial. Geólogo experiente, procedeu de imediato às
avaliações ,sem sequer repousar .”Time is Money” ,dizia.
Após minuciosos exames,sentenciou :- “Isto é Ouro de tolos.”
A multidão –trabalhadores ,comerciantes e famílias inteiras
ouviam.
Atônitos,se entreolhavam em silencio.
-“Isto é como Magenta.”
O populacho inerte...
“Magenta é uma cor-pigmento;mistura de azul com vermelho ,
não é a cor rosa, embora se assemelhe a ela.O nome vem de uma região da Itália,onde
ano passado foi travada uma batalha.O que temos aqui é borra de prata , ou seja
,uma porção ínfima de prata com muitos resíduos de minerais menores,sem valor
comercial...”
Dom Pepe,Histerico ,interrompeu : “Não é Prata!Estamos
falidos.”
O Caos se instalou, a marafona e suas “meninas” ,saíram
rapidamente da cidade ,deixando roupas e corações partidos, Dom Curro, o
especulador, atirou contra a própria cabeça , mas a pistola-nunca usada-
falhou,seguiu então para LA CANTINA e se atirou do segundo piso, conseguindo
quebrar o pescoço. O pároco tentou acalmar os ânimos, mas foi surrado
impiedosamente pelos comerciantes;afinal não era ele que garantia que esta
gentalha tinha alma,esses índios sujos ,responsáveis pela bancarrota.
Muitos nativos se atracaram com comerciantes e alguns até mesmo,
com outros nativos.
As mulheres rasgavam as próprias vestes e gritavam com os
maridos.
“Canalhas irresponsáveis”,gritavam umas.
“Gostam é de putas,isto sim",lamentavam outras.
Dom Blasco tentou se reconciliar com a esposa ,mas esta
resolveu fugir com um índio...
Em meio aos tumultos, Alonzo,um índio batizado,tomou a
palavra e exortou seus conterrâneos a deixar aquele lugar maldito ,que sempre
trouxera miséria aos seus. Tanto Bolivianos ,quanto Peruanos se foram , em
busca de outras oportunidades.
Trabalhadores são assim, nunca desistem,sabem que há bocas
que precisam do suor deles.
Na confusão que acontecia, poucas pessoas mantiveram a
calma. Estranhamente entre elas estavam as duas senhoras , a comerciante e a
poetisa, que observavam –em silencio- o que ocorria.Sentadas na varanda da casa
da escritora ,olhavam para as pessoas ensandecidas,um pôs fogo no próprio
empório, outro vagava com as contas na mão dizendo que iria receber...
"Quebrando o silencio com um longo suspiro", a escritora disse:
- Este lugar é maldito,vou embora com meu companheiro. Este
lugar já foi sugado de tal modo que não resta sequer esperança . O sangue de
milhares encharcou esta terra e agora, em resposta, a natureza nega suas
riquezas ,mas os homens não aprendem e continuam sugando, até esgotar a si
mesmos. Esta é uma maldição humana, a AMBIÇÃO desmedida ,não mudam nunca. É sempre
assim...
O lugar foi abandonado, por muito tempo,a prata não tem o
valor de antes, mas há pessoas lá,HOJE ;continuam cavando, em busca da
PLATA,são nativos e não vivem de modo muito diferente de seus ancestrais.Muitos
perdem a vida em acidentes, a luta pela sobrevivência continua,as condições de
trabalho são precárias. Mas há uma novidade,quando perguntados para quem trabalham,
os locais respondem:
- “EL TIO.”, ou seja “EL DIABLO.”
Autor : Marco Antonio E. Da Costa.
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